Estudante brasileira infectada por COVID-19 é levada a hotel de quarentena em Sydney para não transmitir o vírus

Fachada de hotel de quarentena em Sydney

Fachada de um hotel de quarentena em Sydney. Alguns desses hotéis estão abrigando moradores da cidade infectados por covid para evitar transmissão comunitária. Source: AAP Image/Joel Carrett

Juliana Genovez passou 19 dias isolada em um hotel depois que testou positivo para covid. Governo do estado de Nova Gales do Sul ofereceu estadia à estudante para evitar que ela infectasse as pessoas que moram com ela


Nova Gales do Sul, New South Wales, é hoje o epicentro da COVID-19 na Austrália, com um surto da variante Delta, altamente infecciosa, que já dura cerca de um mês. Os números diários de novos casos giram em torno de cem e os casos ativos se aproximam de 1500, com mais de uma centena de pessoas hospitalizadas. Cinco mortes em decorrência da covid foram registradas até agora, desde o início do surto atual.

Se compararmos esses números com regiões de outros países, eles podem parecer baixos, já que New South Wales tem uma população de mais de seis milhões de habitantes. Mas quando olhamos os dados da COVID-19 na Austrália desde o começo da pandemia, pouco mais de 32.200 mil casos no total e 915 mortes, os números atuais divulgados diariamente pelo governo de Nova Gales do Sul assustam a população e as autoridades políticas e de saúde. 

Nem mesmo o lockdown em boa parte do estado, que já dura quase um mês, tem diminuído a média de novos casos, nem os casos de origem desconhecida ou aqueles que circulam pela comunidade durante o período infeccioso.

Nas coletivas de imprensa diárias, tanto a governadora de New South Wales, Gladys Berejiklian, quanto a Chefe de Saúde do estado, Kerry Chant, ressaltam sempre o quanto a variante Delta é contagiosa, a importância de a população ficar em casa para evitar a transmissão e de fazer o teste e se isolar assim que identificar qualquer sintoma de covid.
Além dos auxílios financeiros que os governos estadual e federal oferecem às pessoas que perderam horas de trabalho por causa do confinamento, o estado de NSW tem oferecido estadia gratuita em hotéis de quarentena para pessoas infectadas que dividem casa e dependências como cozinha e banheiro com outras pessoas, para evitar que haja mais contágio dentro das residências. As casos hoje são um dos locais onde mais as pessoas estão sendo infectadas em Nova Gales do Sul, assim como ambientes de trabalho.

A estudante brasileira Juliana Genovez passou 19 dias em um hotel de quarentena depois que testou positivo para COVID-19. Ela contraiu o vírus na casa da família em que trabalha como babá. Apesar de não ter contato físico muito próximo com os pais, ela beija, abraça e está sempre muito perto das crianças que cuida. Ações mais do que suficientes para ser rapidamente contaminada pela variante Delta.
Juliana covid Sydney
Juliana Genovez, estudante brasileira convidada pelo governo de NSW a se hospedar em um hotel de quarentena em Sydney depois que testou positivo para COVID-19. Source: Supplied
Descoberta da doença

Segundo Juliana, cerca de cinco dias depois que os membros da família testaram positivo, ela começou a sentir os primeiros sintomas, dor de cabeça e dor no corpo. Nesse momento ela já estava em isolamento em casa e tinha feito um teste com resultado negativo.   

“Quando a família com que eu trabalho testou positivo, uma pessoa (do departamento de rastreamento de casos de covid) do governo do estado me ligou para avisar que eu era um contato próximo de pessoas infectadas e que por isso teria que fazer o teste. E mesmo que o resultado fosse negativo num primeiro momento, eu teria que ficar em isolamento por 14 dias”, conta Juliana, e acrescenta: “como eu divido a casa com mais duas pessoas, eu fui orientada a usar máscara nas dependências comuns, como sala, cozinha e banheiro, e usar um produto para limpar todas as superfícies e locais que eu tocasse, para desinfectar.”

Procedimentos após teste positivo

Depois de começar a sentir os sintomas da covid, Juliana fez um novo teste, e mesmo já sabendo que poderia estar infectada, se surpeendeu com o resultado positivo. Segundo ela, no mesmo dia em que ligaram do departamento de saúde para comunicar que ela tinha COVID-19, pouco tempo depois ela recebeu mais duas ligações. Uma foi para que ela informasse por onde tinha passado e com quem tinha tido contato nos últimos dias, pois assim é feito o rastreamento para detectar novos locais de exposição ao vírus e avisar às pessoas próximas que elas podem ter sido infectadas.

A outra ligação foi para perguntar como era a situação de moradia dela. Se ela dividia casa e dependências com outras pessoas e se essas pessoas eram ou não familiares. Quando Juliana disse que dividia a casa e as dependências com mais duas pessoas, que elas não eram da família, que testaram negativo para covid e que não apresentavam sintomas da doença, imediatamente a pessoa que estava com ela na linha ofereceu estadia em um hotel de quarentena enquanto ela estivesse doente e no período infeccioso, para evitar que suas colegas de casa se infectassem.

Juliana achou melhor aceitar, e algumas horas depois da ligação uma van equipada para transportar pessoas infectadas, com um motorista que usava roupas e acessórios para proteção, passou na casa dela para buscá-la e levá-la ao hotel. Juliana conta que o hotel para onde foi levada pertence a uma rede de hotéis, mas que o local foi equipado e adaptado para receber pessoas em quarentena. Segundo ela, havia muitos enfermeiros nos corredores. Ela foi recebida por duas enfermeiras e levada para um quarto que parecia um pequeno apartamento, com sala, cozinha, banheiro e lavanderia.
Vista quarto hotel Juliana
Varanda e vista do quarto do hotel em que Juliana passou 19 dias em isolamento para se recuperar da COVID-19. Source: Supplied
Rotina no hotel

Todas as refeições diárias eram fornecidas a Juliana. Pela manhã, uma pessoa deixava na porta do quarto dela as refeições do dia, com café, chá, lanches, frutas e marmitas de almoço.

O acompanhamento médico também era diário, com enfermeiros a examinando duas vezes ao dia, checando temperatura e medindo pressão. A cada quatro dias Juliana também fazia consultas com médicos por chamadas de vídeo, que perguntavam como ela estava se sentindo, avaliavam o quadro clínico dela e davam orientações de como ela deveria seguir na sua recuperação.

Além disso, ela também recebia o contato frequente de um profissional de saúde de um hospital, que enviou a ela um oxímetro para monitorar os batimentos cardíacos e a oxigenação do sangue. Essa pessoa ligava várias vezes para ela, principalmente nos primeiros dias, quando ela estava mais debilitada, para monitorar os dados registrados no equipamento e, caso percebesse que havia necessidade, a transferir para o hospital. Mas isso não precisou acontecer.

Havia ainda um aplicativo para celular em que ela tinha que responder perguntas relacionadas aos seus sintomas e estado de saúde. No período de 19 dias em que esteve no hotel, Juliana também foi submetida a um exame de sangue e dois testes de covid.

Muito cansaço, fortes dores de cabeça e falta de apetite 

Dores no corpo, cansaço e muita dor de cabeça. Esses foram os principais sintomas que Juliana teve no período em que a doença mais a afetou. “Dar dois passos era algo muito cansativo. Eu só queria ficar deitada”, diz Juliana, que também teve sensação de febre quando acordava no meio da noite suando e com calafrios.

Ela chegou a ter vômito e diarréia, mas por um período mais curto. Juliana disse que não chegou a ter falta de ar, mas durante cinco dias ela só conseguia dormir. Sair da cama, segundo ela, era muito exaustivo. Juliana acordava apenas para tomar remédio e tentar comer alguma coisa, o que era difícil, já que ela perdeu um pouco do paladar e não tinha apetite.

Quarentena solitária

Perguntada sobre como foi passar pela quarentena de 19 dias sozinha, Juliana diz que nos dias em que estava mais debilitada fisicamente, não teve problema em estar isolada, já que ela só dormia, e falar uma ou duas frases era algo que já a deixava cansada. Nesse período ela fez apenas alguns poucos contatos com familiares.

Segundo ela, o mais difícil de estar desacompanhada em um quarto de hotel foi depois que ela começou a se recuperar, principalmente nos últimos dias de confinamento, quando a vontade era de ir para casa e voltar à rotina. Nessa fase ela disse que já não aguentava mais ficar sozinha.
sacada hotel
Apesar de ter ficado em um quarto grande com cozinha, sala, sacada e lavanderia, depois de 19 dias isolada, Juliana não via a hora de voltar para casa. Source: Supplied
A volta para casa

Mesmo se sentindo melhor e recebendo a visita diária dos enfermeiros, Juliana tinha que esperar que os médicos que a atendiam por vídeo a liberassem para voltar para casa. Isso dependia também do resultado do último exame de covid que ela fez, que tinha que ser negativo.

Quando ela recebeu a ligação do médico perguntando como ela se sentia, ela falou que estava bem. Foi aí que ele deu a notícia que Juliana tanto esperava, de que ela estava liberada para deixar o hotel e voltar para casa.

Mas a saída do hotel não aconteceu imediatamente após a ligação. Juliana ainda teve que esperar receber uma carta com orientações sobre a volta dela para casa e as instruções sobre como seria feito o deslocamento. 

Algumas horas depois ela recebeu uma ligação pedindo que confirmasse dados enviados a ela por e-mail, e então ela pode falar com os enfermeiros do hotel e pedir que organizassem sua saída. Foi necessário deixar os corredores livres e vazios para que ela fosse do quarto até a saída do hotel.

Segundo Juliana, a sensação de chegar em casa depois de 19 dias com covid em um hotel de quarentena foi de muita felicidade: “Eu estava ansiosa para voltar para casa porque foram muitos dias. Eu já estava em isolamento antes de ficar doente. Foi um grande alívio. Muito bom poder estar de volta ao meu lugar, com as minhas coisas, podendo fazer a minha comida e seguir a minha vida.”


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