A praticidade portuguesa premiada na Universidade de Sydney

Daniel Dias da Costa, professor da Engenharia Civil da Universidade de Sydney

Daniel Dias da Costa, professor da Engenharia Civil da Universidade de Sydney Source: Supplied

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Daniel Dias da Costa, professor da Engenharia Civil, trocou a vida em Coimbra pela Austrália e foi premiado pelos alunos por seu modo dinâmico de ministrar as aulas


Em novembro, a SBS em português contou a : Marcelo Carvalho, reconhecido pelo desempenho geral na faculdade, e Daniel Gebbran Bacilla Ferreira, professor-tutor da Engenharia Elétrica.

Nesta mesma leva de premiados pelo desempenho em 2019 na Universidade de Sydney está o professor-associado português Daniel Dias da Costa, reconhecido pelos estudantes por sua excelência de ensino. 

A premiação ocorre anualmente e é organizada pela direção das faculdades de engenharia da Universidade de Sydney. O objetivo é ressaltar o trabalho dos melhores professores, professores-tutores e funcionários.
"É extremamente compensador quando vemos o impacto que temos na preparação dos alunos para enfrentar sem dificuldade o mundo empresarial", diz Daniel da Costa.
"É extremamente compensador quando vemos o impacto que temos na preparação dos alunos para enfrentar sem dificuldade o mundo empresarial", diz Daniel da Costa. Source: Supplied
Daniel Dias Costa nasceu no Porto, em Portugal, e estudou Engenharia Civil em sua cidade natal. Depois de trabalhar no mercado e se tornar professor-auxiliar na Universidade de Coimbra, concluiu por lá um doutoramento em mecânica computacional, com base em uma investigação centrada na provisão do comportamento de estruturas e da simulação da propagação de fissuras. Até aí, a Austrália não estava nem próxima de ser uma realidade em sua vida e tudo foi obra do acaso, como ele mesmo nos conta. 

 "Foi por acaso que, ao observar as estatísticas mundiais sobre universidades em engenharia civil, percebi que estavam a cotar professores na Universidade de Sydney. Traduzi meu currículo em inglês, enviei e pouco depois marcaram uma entrevista por Skype. E, em seguida, me convidaram a ir para Sydney para me entrevistar pessoalmente. Em boa verdade, tinha um bom emprego em Portugal, não estava a planear a mudar para Sydney. No entanto, isto acabou por acontecer no ano seguinte, após ter recebido um convite para me juntar a este grupo de investigação."

E a carreira acadêmica do outro lado do mundo não ocorreu sem um estranhamento inicial. Daniel Dias da Costa conta as diferenças entre o ensino na engenharia em Portugal e na Austrália. 

 "Já cá estou há sete anos. O ensino na Universidade de Sydney é muito diferente do ensino em Portugal. A primeira coisa que notei assim que cheguei foi que todos os alunos nos tratam como se fôssemos todos colegas. Em Portugal, ainda existe uma barreira, ou distanciamento, entre a figura do professor e a de aluno. Aqui, não existe nada disso. Isto nos permite abandonar a formalidade tradicional e criar uma interação que muito beneficia a aprendizagem. Quando comecei minha carreira, fui responsável pela disciplina do betão armado. É uma das disciplinas fundamentais de qualquer curso de Engenharia Civil em qualquer país. Com quase 300 alunos, foi uma experiência única. Antes disso, eu tinha ensinado para um máximo de 100. As aulas aqui são dadas em grandes anfiteatros e o professor tem que ser capaz de interagir com todos os alunos, e de manter seu interesse nas aulas. Neste sentido, sempre trago casos práticos da minha breve carreira na indústria, exemplos estes que motivam os alunos a aprender mais e que são responsáveis por um grande sucesso escolar."
Adaptadíssimo ao ambiente acadêmico australiano, o professor Daniel crê que seu estilo informal, baseado tanto em sua vivência tanto como aluno quanto na indústria, permitiu a ele uma ligação mais profunda com os estudantes, o que tem reflexo direto no aprendizado. 

"A minha abordagem ao ensino tem várias características únicas com base em minha experiência de aluno, com base em minha experiência profissional, e também com base na minha reflexão que faço diariamente, no impacto que eu tenho na aprendizagem. A minha abordagem tem vários níveis, o que cria uma experiência muito positiva. A preparação começa com a escrita e envio de material semanalmente, e esse material é essencial para capturar a atenção dos alunos, e para estimular a curiosidade. Neste material que envio, descrevo casos reais, se possível baseado em notícias mais recentes, os quais são relacionados com a matéria que irá ser explicada nesta mesma semana. Isto permite aos alunos, por um lado, identificar um interesse nos assuntos estudados, e, por outro lado, ver a relevância do que vão aprender. Quando eu era aluno e estudei a mesma matéria, o fiz sem compreender qual era sua utilidade. Não me impediu de ser bem sucedido enquanto aluno, mas não teve o mesmo impacto que poderia ter se fosse lecionado de outra forma. Verifiquei também que esta era uma das muitas fontes de insucesso de muitos de meus colegas. Por isso mesmo é importante manter contato com os alunos, semanalmente e mesmo em cada uma das aulas eu os abordo sempre que posso para obter sua percepção de aprendizagem. Na Austrália, as aulas são gravadas e colocadas online no final de cada semana letiva. Por isso, se os alunos não a virem, deixam rapidamente de atender as aulas e ficamos sem alunos. Por isso, cada aula em interajo com eles, faço-os questionarem, e partilho suas dúvidas e explico a matéria enquanto que eu faço. Isto permite criar um ambiente informal de aprendizagem, um ambiente que é mesmo muito bem sucedido. Cerca de 90% dos alunos referem que tiveram uma experiência positiva de aprendizagem neste modelo letivo. Ao contrário de outros professores, eu também participo ativamente de aulas práticas semanais, aulas estas que são lideradas pela minha equipe de tutores. Mas o fato de eu atender a estas aulas faz com que eu possa interagir com cada aluno, posso ouvir as dificuldades que eles têm em resolver os problemas práticos, e depois, durante a semana, desenvolvo especificamente um material que permite esclarecer estas dúvidas. Isto é fundamental e foi uma técnica que desenvolvi que permite evitar dificuldades sentidas que possam se acumular durante o semestre e que leva aos alunos a perder o interesse e que possam eventualmente a falhar na avaliação final."
Quando eu era aluno e estudei a mesma matéria, o fiz sem compreender qual era sua utilidade. Não me impediu de ser bem sucedido enquanto aluno, mas não teve o mesmo impacto que poderia ter se fosse lecionado de outra forma. Verifiquei também que esta era uma das muitas fontes de insucesso de muitos de meus colegas. Por isso mesmo é importante manter contato com os alunos
O professor Daniel Dias da Costa afirma receber mensagens de ex-alunos até hoje, a dizer que ainda utilizam a estrutura didática que aprenderam com ele. E que isso é muito gratificante. 

"Também desenvolvi apontamentos didáticos que explicam a matéria que mostram exemplos reais de design de estruturas, por vez que recebo ainda emails de engenheiros que foram meus alunos no passado a referirem que ainda usam as notas de cálculo que desenvolvi no gabinete em que agora trabalho. Isto é muito positivo e mostra o impacto que nosso trabalho tem, e que mesmo após vários anos, os alunos ainda reconhecem e utilizam estes mesmos materiais que lhes foram fornecidos. E agradecem pessoalmente à nossa equipe. Todo o ensino que desenvolvi, as notas de estudo, preparação das aulas e tutoriais, articulação das equipes para as aulas práticas, requer muita energia e muito investimento pessoal. Mas é extremamente compensador quando vemos o impacto que temos na preparação dos alunos para enfrentar sem dificuldade o mundo empresarial."

Por último, o professor Costa ressalta o alto nível dos profissionais da Engenharia formados tanto no Brasil quanto em Portugal. E que a Austrália tem oportunidades a quem as procura nesta área.
Os engenheiros formados em Portugal e no Brasil têm uma base muito sólida. São inovadores nas abordagens e na sua forma de pensamento, o que é essencial na resolução de problemas industriais e problemas da engenharia
"Os engenheiros formados em Portugal e no Brasil têm uma base muito sólida. São inovadores nas abordagens e na sua forma de pensamento, o que é essencial na resolução de problemas industriais e problemas da engenharia. Existem muitas oportunidades para viver a Austrália do ponto de vista do estudante acadêmico, por exemplo, fazendo um doutoramento ou mestrado, ou mesmo diretamente para a indústria. O povo australiano é multicultural e valoriza o indivíduo pelas suas capacidades. Acima de tudo, é importante fazer-se aqui o que se gosta. Quando encontramos uma atividade de estudo, e mais tarde, profissional, de que gostamos, torna-se muito fácil darmos o melhor de nós, e nesse processo, as pessoas que nos rodeiam são beneficiadas por isso. "

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